O que eu gosto
Amigos músicos
São Paulo, 21 de novembro de 2007    
Amigos músicos

De uns tempos para cá alguns amigos têm “soltado a franga” como se diz na gíria. Isto é, traders, jornalistas e outros profissionais de minhas relações têm se mostrado artistas talentosos. E gravado cds. Sempre digo que disponho-me a comprar o cd desde que não seja obrigado a ouvi-lo. Mas eles me dão gratuitamente, portanto, sou obrigado a escutá-los. Um deles tem uma magnífica banda que toca grandes canções dos Beatles. Os dois cds gravados são deliciosos. Outro canta, dança e compõe música brasileira moderna, embora no dia-a-dia venda derivativos de soja. Costuma apresentá-las nas festanças que faz nos seus aniversários. Um outro comanda uma orquestra magnífica de música clássica brasileira. Também já gravaram dois cds. E o último que apareceu com um cd foi o Alê Benê, com o seu rock’n’roll Namastê, sabe-se lá o que isso quer dizer. Mas é bem humorado, não tenho dúvidas quanto a isso. Esse texto não é uma crítica musical, longe disso, estou mais para crítico de abobrinhas que de músicas. Aqui trata-se de algumas observações sobre amigos que lidam com os mercados financeiros e com textos jornalísticos explorando outros talentos, escondidos ou não, que cantando, compondo ou dirigindo vêem à tona. É difícil escrever sobre isso, sobre amigos músicos, mas sigo em frente. Afinal, o texto é para falar das qualidades que vi e não dos defeitos, embora não possa negá-los. Esses meus amigos trabalham o dia todo, não são ricos, não sei onde arrumam tempo e dinheiro para realizar esses sonhos, não sei a que horas ensaiam, como pagam os estúdios de gravação, só para citar algumas coisas. Então, levando isso em consideração, para mim todos esses cds significam uma vitória. Talvez uma vitória absurda. E por falar nisso, em absurdos...
“O absurdo é apenas o começo”, é o título do cd da banda do vocalista Alê Benê, Donos do Escuro (www.donosdoescuro.com). Precisei ouvir três ou quatro vezes para formar uma idéia do conteúdo, mas sou assim mesmo, quando compro um cd seja de quem for necessito ouvir algumas vezes para saber se gostei ou não. Em “Quero ser presidente”, Alê, vocalista do grupo, faz uma crítica ácida e bem humorada da mente humana. A composição de Cesar (cordas e backing vocals), “Pouco de mim”, é uma canção de amor e tem o Alê tocando o imperdível Pente. Em “Sou do tipo que não” já aparece a influência na maneira de cantar do insubstituível Raul Seixas. Na canção seguinte, “Seu Zé é o cara”, Alê trata de um dos seus assuntos prediletos, os místicos revolucionários. Dos que ele apresentou-me fico com Osho. Cesar criou uma música e letra debochada, é a divertida “No dia em que morri”. Sua interpretação também é cheia de swing. Minha frase predileta é: “Ninguém falou, fui eu que vi, eu tava vivo, muito vivo no dia em que morri”. Alê volta com outra música, “O Jogo”, onde dá a sua opinião sobre essa “zorra” a qual ele se refere na primeira canção do cd. A única dúvida que tenho é se, como escreveu Alê, eles não sabem que a gente joga o jogo. A dor de cotovelo, não clássica, reaparece em “Deixando você”, do Cesar em outra interpretação bem calibrada para um tema triste. Na versão “Roubaram minha mulher”, Alê canta ao estilo Raulzito misturado com um toque de Elvis Presley. E se eu tivesse que escolher uma canção para divulgar o cd, seria “Camiseta Rasgada”, pelo humor, ironia e sarcasmo. “Duas tampas de margarina e uma frase inusitada, ganhei a casa própria, o carro e uma bolada”, ou “Mais que amigo é o cacete, você nunca gostou de mim, eu sei que é da minha grana que você está a fim”, canta em grande estilo Alê. Tato, o terceiro membro da banda, fica com a maior competência na cozinha com seus instrumentos de percussão, participa de todos os backing vocals e ficou ótimo na foto da contracapa do cd. Claro, eles mereciam muito mais condições técnicas (Alê avisou-me que a verba era curtíssima), e essas firulas que enriquecem as gravações, mas mostram o talento sem vergonha. Afinal, como eles mesmos dizem, o absurdo é apenas o começo.
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