O que eu gosto
Comedidos e falastrões (*)
São Paulo, 7 de novembro de 2007    
José Venâncio de Resende é um jornalista mineiro. Resolveu encarar uma tarefa difícil. Enfrentou e venceu. Escreveu o premiado livro “Construtores do Jornalismo Econômico, da cotação do boi ao congelamento de preços”. Trata-se da história do jornalismo econômico brasileiro desde os primórdios até 1986, caso eu não esteja enganado. Para quem, como eu, conheceu ou conhece muitos desses construtores e trabalhou com alguns deles, o livro é imperdível, até por motivos não muito nobres, como descobrir algumas falsas verdades ditas por colegas que inebriam-se com a própria voz. Considero leitura fundamental para estudantes de jornalismo e para estudiosos da história do jornalismo no Brasil.
Já comentei com o autor que percebi alguns deslizes no acabamento do livro. Fato normal. Nunca escrevi um livro, mas imagino que essa parte deva ser a mais torturante de todo o processo. De forma alguma isso tira o brilho do exaustivo trabalho bem feito que o José Venâncio realizou. A leitura do livro deu-me muito prazer e boas gargalhadas. Conheço o glorioso Mário Mazzei Guimarães, trabalhei com o Biondi, que foi obrigado a demitir-me do DCI, tenho profundo respeito pelo Ivan Jun Nakamae, Jun para os íntimos, apesar de discordar da visão que ele tem da Associação dos Jornalistas de Agropecuária, Ajoagro, e pelo José Maria Nogueira de Campos, sem falar dos tempos em que trabalhei com o Turco, Luiz Nassif, na Agência Dinheiro Vivo, e com o Zé Paulo Kupfer, na rádio CBN. Muito trabalho e também diversão garantida, ninguém é de ferro.
Uma coisa notável no livro do Venâncio é que os personagens raramente foram demitidos, se é que algum deles foi. Nos depoimentos sempre informam que discordaram ou do patrão ou da linha editorial assumida pelo jornal e por aí vai. Comigo as coisas não foram bem assim. Fui demitido sim, mais do que eu gostaria. Uma das piores e mais humilhantes ocorreu na Folha de S. Paulo. Fui demitido por um cara do bem, um grande jornalista de Economia, Gabriel Junqueira. Ele chamou-me, a gente ainda trabalhava no tal do mesão, cheio de copies. Eu começava a burilar os meus textos. O Gabriel deu-me a notícia. A última coisa que eu queria ouvir era aquilo. Ali, ao lado do mesão, ambos em pé. Eu quase chorei, o Gabriel não sabia o que fazer. Jamais vou me esquecer do olhar desesperado dele dizendo para eu me acalmar. Foi horrível, só de lembrar-me sinto-me desconfortável. Fique em paz, Gabriel, já passou, mas foi difícil para nós dois.
Outro fato relevante é o depoimento de três jornalistas. Um deles transforma umas newsletters das quais nunca ninguém ouviu falar, como as principais publicações do jornalismo econômico mundial, para as quais ele teria colaborado. E sai ditando regras para todos os lados. É um bobo reconhecido internacionalmente. O outro crê que criou o mundo e sugere que a Bolsa de Mercadorias & Futuros, BM&F, teria sido inspirada no seu livro, que bazófia!!! É difícil encontrar espaço para tanta empáfia, soberba e petulância. E o terceiro, exemplo mais que completo do provincianismo gaucho, questionado sobre a criação do jornalismo econômico, passa longos momentos falando do seu apreço pelo caudilhismo do senhor Brizola. Nada a ver com o assunto do livro. Esse é o bobo regional. Enfim, os três patetas não teriam desempenho melhor.
Apesar desses tontos inevitáveis, o livro é necessário, até porque o ridículo também faz parte dessa história. Como diz um amigo meu, “Reche, o ridículo me persegue”. A diferença entre esse meu amigo e os falastrões, é que o meu amigo percebe.

Construtores do Jornalismo Econômico
Da cotação do boi ao congelamento de preços
José Venâncio de Resende
Ícone Editora
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iconevendas@yahoo.com.br
editora@editoraicone.com.br

(*) Essa é a versão amaciada do texto original. O anterior, digamos, era muito mais virulento, mas meus conselheiros secretos deram-me motivos para mudar e deixá-lo mais leve. Um dia, talvez, vocês conhecerão o outro. Com a sogra, a esposa e com bons amigos não é aconselhável discordar. Faço parte dessas pessoas.
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