Deixei de levar à sério os críticos de jornais, revistas, suplementos e afins há muitos anos. Isso ocorreu quando fui ao cinema assistir a “comédia” (assim estava classificada nas publicações) de Win Wenders, Bagdá Café. O filme é excelente, mas na minha opinião está longe de ser uma comédia. Volto agora a falar de críticos a propósito de um romance da norte-americana Donna Tartt, O pintassilgo, Prêmio Pulitzer do ano passado. O livro foi elogiadíssimo nos Estados Unidos e na Europa. Reproduzirei no corpo desse texto alguns comentários que vieram na contracapa da edição brasileira feita pela Companhia das Letras. Li em poucos dias o calhamaço de mais de 700 páginas. Em alguns trechos achei o texto arrastado, pesado, mas sobrevivi. Não vou ficar contando o romance, acho isso uma chatice dos críticos. Se quisesse que alguém contasse para mim não precisaria comprar o livro, o que faria bem para o meu orçamento mensal. O fato é que O pintassilgo não me entediou. Mas parece ter causado profundo desgosto para a economista e escritora Eliana Cardoso, que escreve quinzenalmente na seção “Outros Escritos”, no caderno Eu& Fim de Semana, do jornal Valor Econômico do dia 2 e 3 de abril deste ano. Talvez ela não tenha gostado das palavras publicadas no jornal britânico The Guardian: “Raymond Chandler é uma presença tão grande nestas páginas quanto Dickens ou Dostoiévski. Falar mais sobre a trama seria privar os leitores do imenso prazer de ser arrebatado por O pintassilgo. Se alguém perdeu o amor pelas histórias, este é o livro que certamente o trará de volta.” Dona Cardoso discorda: “Alguns críticos atribuíram a esse romance de 720 páginas qualidades de Dickens. Acho que foi um equívoco. A comparação talvez tenha sido motivada pelo órfão que vence na vida. Ou por tramas interligadas. Ou por reviravoltas que fazem o leitor terminar cada capítulo ansioso para começar o próximo. Existem, entretanto, diferenças formidáveis entre Dickens e Donna”, escreveu. “...o leitor terminar o capítulo ansioso para começar o próximo” parece-me uma grande qualidade, mas como avisei no título, não sou crítico literário. Leio sempre as colunas da dona Cardoso, embora nem sempre as aprecie. Imagino que não aceite a minha sugestão, mas ela possui um vício de linguagem detestável e que soa de uma falsidade incomum, “meu querido”. Quando alguém me chama desse jeito, atravesso a rua. Ela termina a referida coluna desta forma: “Se você, meu querido, procura um romance inconseqüente para se divertir na praia, vá em frente. Se não for esse o caso, não perca seu tempo.” Michiko Kakutani, do The New York Times, pensa diferente da crítica do jornal Valor Econômico. E disse sobre o romance da Donna Tartt: “Brilhante... Um romance glorioso, no qual todos os talentos narrativos de Tartt convergem numa arrebatadora sinfonia: um livro que nos traz de volta o prazer de passar a noite inteira lendo.” Dona Cardoso continua a sua desconstrução: “Pulei algumas passagens que descrevem longos episódios sem nenhuma relevância para a história, numa técnica aborrecida de adiamento do desenlace.” Ora, se ela não leu como sabe que os textos não lidos não continham “nenhuma relevância para a história”, pergunto-me? Essa declaração fez com que eu me lembrasse de uma amiga que era capaz de discutir horas, à época um livro do momento, Jogo de Amarelinha, de Julio Cortázar. Um dia confessou-me, depois de algumas taças de vinho, que só tinha lido a orelha do livro. Se você ficou aterrorizado com o que leu agora, posso garantir que isso é verdade, pois assisti essa cena algumas vezes, e não apenas com o livro do Cortázar. Terror! E por falar nesse tema, um dos reis do terror, Stephen King, também gostou do livro de Tartt: “Um livro raro, desses que aparecem talvez meia dúzia de vezes numa década, um romance literário e inteligente, que fala tanto ao coração quanto à mente. [...] Um extraordinário trabalho de ficção.” Não acredito que escritores medíocres consigam tapear quem confere um Prêmio Pulitzer, assim como respeito as opiniões que divergem das minhas. Recomendo sim, a leitura de O pintassilgo, não acho-o um “romance inconseqüente, para se divertir na praia.” Para terminar, outra afirmação da dona Cardoso: “Você, meu querido, já notou que sempre (ou quase sempre) escrevo sobre livros adoráveis. Pois hoje vou abrir uma exceção. Fiquei surpresa com o Pulitzer de 2014 para ficção: “O Pintassilgo”, de Donna Tartt (tradução de Sara Grunhagen, Companhia das Letras). O prêmio já coroou grandes autores, como Saul Bellow, Philip Roth, John Updike, John Cheever, Cormac McCarthy e Junot Diaz. Por que iria para “O Pintassilgo”? Responderei. Talvez o livro de Donna Tartt não seja tão bom quanto as críticas que recebeu fora do Brasil, mas seguramente não é ruim como nos faz crer a articulista do jornal Valor Econômico, Eliana Cardoso. É o que acho, “minha querida.” E também acho melhor a senhora escrever sobre os livros que gosta, pois quando faz o contrário, erra feio, como é o caso de O Pintassilgo. É isso.
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