O que eu gosto
Homem e o molho inglês
São Paulo, 22 de fevereiro de 2015    
Gosto de cozinhar. Isso não quer dizer que eu seja um cozinheiro, um chef, embora tenha criado um personagem para as minhas estripulias entre panelas, frigideiras, espátulas, travessas e assadeiras. Quando estou na cozinha é obrigatório chamar-me de chef Medrano, meu último nome, e, claro, com sotaque francês, chef Medranô. Essa paixão por cozinha vem de longe. Quando meus pais se mudaram para Guarulhos, nos longínquos anos 50 do século passado, para uma casa construída com as mãos calejadas do meu pai e do meu avô materno, o pedreiro espanhol de Barcelona, Alberto Reche, eu era uma criança de dois anos de idade. E lembro-me com uma precisão acachapante da minha mãe, dona Maria, Nena para os íntimos, lavando roupa no tanque e cuidando de mim, deitado dentro de uma caixa de “manzanas argentinas”. Naquela época não se produziam maçãs no Brasil. Cresci e estudei por ali. A casa era o que chamavam antigamente de “cômodo e cozinha”. Na realidade eram dois quartos, uma sala, banheiro, uma grande área de serviço e a minha inesquecível cozinha, além de um grande quintal onde Peri, um vira-latas preto e branco, e depois um buldogue, marrom com manchas brancas, corriam de nós e atrás de nós. Não sei se é real, mas parecia-me grande, um pia enorme, o fogão, a geladeira e uma mesa onde fazíamos nossas simples refeições. Era a reunião familiar. Sempre me encantei por panelas grandes e pequenas, frigideiras, aqueles garfos, conchas, escumadeiras e colheres de pau de todos os tamanhos e formatos e todos aqueles apetrechos que se usam nas cozinhas. Isso tudo me fascinava. E me encanta até hoje. Não temo em dizer que em uma casa a cozinha é o melhor lugar do mundo. Talvez você pergunte-se onde eu escrevo esse texto? Em uma cozinha, claro. O que vejo? O fogão inerte agora após o almoço. Mais além o litro de azeite italiano, um liquidificador, potes com os mais variados temperos, pegadores de silicone que mais parecem duas cabeças de ursos em miniatura, aquele imã onde se deixam as facas presas na parede e o secador de louças abarrotado após outro almoço gostoso de um domingo quente de fevereiro quando, finalmente, acabou essa pôrra de horário de verão. Que venha o inverno ou temperaturas um pouco mais amenas. O título desse texto foi escrito outro dia e sei do que eu queria falar, mas contarei a história de molho inglês em outra oportunidade.
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