A do dia
Preços se sustentam e melhoram o humor dos players
São Paulo, 18 de outubro de 2015    
Por Arnaldo Luiz Corrêa (*)

O mercado de açúcar continua dando alegrias para aquelas usinas que adotaram uma política de risco e de fixação adequadas. É claro que tem gente chorando com os acionamentos de operações de balcão que nos atuais preços dobraram seus volumes fixados, mas no geral o mercado melhorou o humor do setor. Nesta sexta-feira, o vencimento março/2016 fechou a 14.27 centavos de dólar por libra-peso, praticamente inalterado em relação à semana passada. Ficou assim até o vencimento julho/2017. Nos demais meses de negociação até o maio/2018 houve melhora de preços em torno de 4 dólares por tonelada.
Os preços atuais da commodity, considerando apenas o fechamento do primeiro mês de negociação no mercado futuro de açúcar em NY convertidos em reais pela taxa do câmbio de fechamento do dia fornecida pelo Banco Central, atingem R$ 1.250 por tonelada. Lembre-se que há menos de três meses usando o mesmo critério citado o preço era de R$ 830 por tonelada. No intervalo de no máximo 20 dias úteis o preço em reais por tonelada subiu mais de 30%. Duas coisas a comentar: a última vez que vimos esse nível de preço em reais foi em fevereiro de 2011 (NY a 32.68 centavos de dólar por libra-peso e dólar 1.680) e a última vez que vimos um aumento desse percentual foi em novembro de 2010. Ou seja, estamos numa situação única. A média dos últimos cinco anos foi de R$ 942 por tonelada e a média de NY foi 19.69 ce ntavos de dólar por libra-peso!
Os fundos estão comprados em 133.500 lotes e, segundo Marcos Masagão, analista da Futures Analysis (http://www.futureanalysis.com.br/) o preço médio de entrada dos fundos desde que começaram a construir essa posição é de 13.53 centavos de dólar por libra-peso, o que significa um lucro ainda não realizado de US$ 110 milhões sobre a mesa, tomando por base o fechamento de sexta-feira. Ainda é pouco pelo que já vimos no passado. A percepção dos fundos é de que o açúcar parece ter limitado risco de queda, principalmente se compararmos o desempenho acumulado nos últimos doze meses.
O que me incomoda um pouco é que o mercado físico ainda negocia a um nível de desconto acima do que seria razoável (considerando custos financeiros e de armazenagem e seguro), ou seja, a demanda pelo físico ainda está em dicotomia com o futuro. Para validar de maneira irrefutável a virada do mercado seria necessário que começássemos a ver uma efetiva melhora dos valores negociados no mercado físico. No entanto, cresce a cada dia a perspectiva de qual será o déficit mundial no açúcar. Começamos com 1.8 milhões de toneladas e agora estamos em 5.8 milhões de toneladas, segundo Artur Manoel Passos, economista e analista de commodities do Banco Itaú.
Outro ponto importante para a sustentação dos atuais níveis é que o mercado está invertido, ou seja, os preços com vencimento mais curtos estão mais altos do que os preços mais longos. Isso ocorre no março em relação ao maio, visto que se trata da entressafra no Centro-Sul e também no maio em relação ao julho, que acende uma luz amarela. O mercado, caros leitores, parece acreditar que o início de moagem da próxima safra será mais tardio, haverá menor disponibilidade de açúcar no começo pois as usinas deverão privilegiar o etanol, existe pouco açúcar disponível para venda contra maio porque o volume de fixação já é alto comparativamente aos outros anos e, portanto, algumas tradings se anteciparam e compraram o spread maio/julho.
Embora ainda mantemos nossa estimativa da safra de cana para o Centro-Sul em 581.2 milhões de toneladas, produzindo 30.6 milhões de toneladas de açúcar e 26.5 bilhões de litros de etanol, um outro acompanhamento que fazemos por meio de modelos, mostra que esse número pode ser ligeiramente inferior, chegando a 576.3 milhões de toneladas. No ano passado, usando exatamente os mesmos critérios que temos usado nos últimos anos, nosso número de safra de cana para Centro-Sul era de 575 milhões de toneladas enquanto grande parte das previsões do mercado apostava em números até acima de 600 milhões de toneladas. O número final, segundo a UNICA foi de 571.3 milhões de toneladas.
Um forte argumento de um conhecido produtor de cana é que “não podemos subestimar a moagem que vai ocorrer depois de 15 de dezembro”, o que pode fazer a diferença no argumento do parágrafo anterior. De qualquer maneira, penso que vamos mesmo ter um ano bem mais construtivo.
Começou nesta sexta-feira nos Estados Unidos campanha na TV americana patrocinada pela indústria de petróleo objetivando persuadir Obama e os consumidores que o etanol é pior para o clima do que a gasolina, aumenta o custo dos alimentos, prejudica motores, entre outras coisas. Com o petróleo historicamente baixo, cada um puxa a sardinha para a sua brasa. Quem está há muitos anos no mercado de commodities já presenciou esses debates desagradáveis. O café já foi vilão da saúde, o açúcar também, agora o etanol “polui mais que a gasolina”. É um despudorado salve-se quem puder, reflexo de preços baixos.

(*)Arnaldo Luiz Corrêa é CEO da Archer Consulting e esse texto é republicado aqui com a sua anuência.
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